terça-feira, 4 de outubro de 2016

Pequenas maldades cotidianas

Festinha do meu aniversário de oito anos. A criançada corria pelo apartamento simples e de cômodos grandes em que morávamos no Alto da Glória. Entre os convidados havia uma japonesinha com quem eu nem tinha proximidade, mas acabou indo por estudar na mesma escola e ser vizinha.

As crianças se empenhavam no ritual insano de correr, comer um doce, tomar refri e dá-lhe correr, que de tempo em tempo minha mãe interrompia para eu receber os parabéns de algum convidado e... o presente, claro! Uma tia trouxe uma caixinha que até me animou. Sacudi, um certo peso, desembrulhei e era um joguinho de... sabonetes especiais. A alegria da criançada. Saiba que isso era comum antigamente, tempos bicudos.

Disfarcei, sublimei, e estava voltando para a correria, mas tinha a japonesinha, meio gordinha, pragmática até os ossos, assim que eu coloquei os sabonetes entre os presentes ela parou do meu lado e disse “Com esse presente ela está dizendo que você fede, que precisa tomar banho”.

No momento aquilo só me causou um certo desconforto. Mas hoje, consciente, repensando o pequeno ato de maldade involuntária (ela só repetiu o que aprendeu), a conclusão é que a raça humana não passa de lixo empilhado.

Eu era moleque ainda quando tive uma experiência que me jogou na cara o quanto o ser humano é desprezível, e que não há salvação. Só correr desesperadamente como crianças em festas de aniversário.

:: 04.10.2016 ::

quarta-feira, 25 de maio de 2016

Convergência: a única salvação dos perversos

Tomou o que era talvez a última dose do destilado de agave, se ajeitou na cama e ficou pensando nela, deitada a seu lado. Desejava a mulher, mas de um jeito diferente. A ereção lhe fez tremer o corpo, porém a combustão não era por estimular a lasciva num coito tradicional. Não era isso. O desejo primitivo era por se masturbar olhando para ela, mas de modo que toda atenção dela estivesse dedicada ao vai-vem frenético.
“Quem é o mestre?”
“Como assim?”, ela levantou a cabeça com olhos curiosos.
“Quem é o mestre, ele ou eu?”, apontando para ela sua virilidade inchada.
“Você. A atração é sempre pela cabeça de cima.”

Com receio de intenções divergentes, ele ameaçou se recolher. Mas como lhe tivesse lido o pensamento, ela se abriu em flor e começou o trabalho.
“Quero você fazendo que nem um macaquinho tarado.” E se fartaram um do outro.

Para alguns tipos de gente, essa não seria uma madrugada feliz.

:: 25.05.2016 :: o início, rabiscado num guardanapo numa viagem sabática reveladora em março/2011; concluído só agora