sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Tudo parece ruir na quarta-feira de cinzas

Terça-feira gorda que me suga os fundilhos. Acordo com um cachorro lambendo minha boca na beira do calçadão. Na hora de levantar esbarro na garrafa de coquinho vazia, que tomba e faz um barulho de morte.

Madrugada ainda e os caras me esperam de carro pronto se dividindo entre se esbugalhar de rir da minha expressão amarrotada e da fantasia (vestido rosa e peruca) manchada de vômito seco ou me esculhambar pelo atraso, porque três de nós, inclusive eu, trabalham ao meio-dia.

A chuva continua, rotina de todo o carnaval desde que chegamos a Laguna. Quatro dias de folia sob o dilúvio. Não acho roupa seca para voltar e nem um centavo na carteira.

O que faz desta a maior quarta-feira de cinzas de todos os tempos é — na metade exata da viagem, quando se enxerga o mar na passagem por Barra Velha — ver o sol nascendo sob o céu azul-alaranjado. Tremendo cheiro de cachorro molhado no carro. Amaldiçoo sim, mas porque tenho vontade de voltar ao Mar Grosso.

:: 27.02.2009 ::

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Surto carnavalesco

Em meados da década de 80, em Curitiba, o barato era pular carnaval em salão, nos clubes como Morguenal, Pinheiros, Thalia etc. Agora todo mundo vai pra praia e bebe até cair atrás de trio elétrico.

Nos salões era uma beleza. De alguma forma o caos da dança se organizava num círculo imaginário em que todos rodavam pelo salão no mesmo sentido, perfeito pra paquerar, pegar as moças pela cintura, entrar nos trenzinhos e encoxar pra valer.

O melhor era o do Santa Mônica, que ficava a uns 25 km do centro. Como éramos todos "dimenor", o jeito era ir de carona. Os pais do Bilo adoravam festa e eram sócios do clube. Sempre se prontificavam a colocar uns quatro ou cinco no carro. Gente boa da melhor qualidade, mas... doidos de pedra.

Naquele dia fui com três amigos (que não conheciam os pais do Bilo) na casa deles pra carona solidária. O Bilo abriu a porta e a cena que se seguiu foi chocante. O pai sentado no sofá assistindo tevê com binóculos, bradando "Não é possível. Isso é bunda de mulher, não pode ser travesti!!!". Detalhe: tinha um papagaio caminhando na cabeça dele. Ao perceber o olhar aterrorizado da rapaziada, justificou: "Quebrei meus óculos e com o binóculo consigo ver melhor. É, minha mulher não me põe chifre na cabeça. Ela põe o papagaio." Daqui a pouco aparece a mãe entornando um copo duplo de whisky e falando arrastado. Ela que ia dirigir, óbvio. O Bilo trouxe um potão de amendoim pra gente aperitivar, mas já avisou que tinha bicho dentro. "É afrodisíaco", explicou o pai, "hoje vai ter!"

Foi difícil convencer a rapaziada a entrar no carro, mas fomos. Depois teve o episódio do posto de gasolina, em que eles colocaram querosene junto com o álcool pra queimar melhor. Na entrada do salão era outro problema, pois dois estavam de peru. Usávamos as carteirinhas na base do rodízio (um entrava, saía com duas carteiras, outro entrava com a do que estava lá dentro). Aí as fantasias ajudavam — foi numa dessa que chocamos o Santa Mônica (tradicionalista) vestidos de mulher, pois a maquiagem disfarçava as fotos, mas isso é outra história.

Depois, no salão, foi uma festa só. Os pais do Bilo tinham energia de sobra pra aguentar a bandalha até o dia clarear. Gente boa assim ensina e deixa saudade.

:: 19.02.2009 ::

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Mais simples do que você imagina

O pai e o filho de 26 no café da manhã, antes de irem para o trabalho.
— Putz, pai, tive o maior pesadelo nessa noite.
— Que foi?
— Sonhei que minha namorada estava grávida.
— Ficou preocupado com a responsabilidade e o trabalho que dá manter a criança, né?
— A primeira coisa que me veio à cabeça foi que o berço não ia caber no meu quarto.
— Aqui em casa?
— É, mas aí eu pensei que o quarto do pai e da mãe é maior, aí a gente colocava o berço lá.

:: 04.02.2009 :: Extraído de uma conversa de escritório

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Maior ventania registrada nos últimos 100 anos

O Zé (não o dos contos, este é outro) é um grande amigo nosso, da TS-85 (que raios é isso? nem no google tem) que está em exílio intencional na França. E como era de se esperar, tá com banzo. Saudade, amigos, deixa a veia poética aguçada. O que publicamos abaixo não é exatamente um conto, mas um depoimento do que ele viveu na real há algumas semanas, no inverno francês. Ele escreve com o coração, cinismo e muito talento (cadê o blog, Zé?)

Zé Gasparin, de Tolouse, França - Maior pé-de-vento aqui no final de semana que passou. 130 km/h com rajadas de 170 km/h. Encontro de duas baixas pressôes no Atlântico, que atravessaram o norte da península Ibérica, Espanha e sul da França (paralelamente aos Pirineus), chegando no Mediterrâneo e atingindo também a Córsega (lá onde exilaram Napoleão). Avisos e alertas vermelhos a partir de sexta à tarde.

Na sexta à noite (início previsto da "tempête parfaite": quatro da matina de sexta para sábado), saí para verificar a segurança das venezianas, a posição dos carros no pátio pra não correr risco de preju, juntar alguns brinquedos da Maeva que ficam fora. Estava incrivelmente calmo, céu estrelado, tudo parado, prenúncio de uma grande cagada. Como nos filmes, nem passarinho piava. Incrível como a natureza manda suas mensagens, basta a gente estar ligado!

Pois bem, veio a ventania tal qual anunciada. Acordamos algumas vezes com o assovio do vento e balançar das janelas (antigas, 2,80m por 1,20m de largura). Mas como moramos no térreo e o castelo e sólido (construído no século XII e "reformado" no XVI), fiquei tranquilo. A Maeva dormia como anjo, isso era o mais importante.

Sábado cedo, tomando meu café, susse, o vizinho aqui do castelo que mora no segundo andar bate à porta: "Bonjour José!". Disse que não via a copa da árvore do vizinho de sua janela, tampouco o carro da Elena no estacionamento! E deu um sorriso de canto de boca. Pensei: "Típica história do gato no telhado". Agradeci e tranquilamente terminei meu café, já que ventava muito forte ainda.

Perto do meio-dia fui ver o estrago e fiquei de cara! O vento, de tão forte, quebrou a metade da árvore (de uns 4 m) do vizinho, que andava meio podre, arrastou-a uns cinco metros, forçou a cerca que divide o jardim ao lado do estacionamento do chateau (amassando-a como papel), vindo se aconchegar sobre o Yaris (Toyota dos pequenos) da Elena. Estrago: capô em "V" e parabrisa estilhaçado. Um "S" de um dos galhos de uns 25 cm de diâmetro parou a uns 3 cm do volante... O outro pedaço da àrvore "assentou-se" sobre o tanque de gasolina e guidão da Guzzi 1200 do vizinho. Essa pouco rodada. Fiquei com pena dele.

Tirei várias fotos pro seguro e depois foram 40 minutos com uma motosserra emprestada para "fazer lenha" da arvore tombada. Senti-me um idiota por ter saído na noite anterior, olhado as árvores e não antecipado a possível queda da árvore do vizinho.

O seguro já se encarregou de tudo (aqui não tem PT quando as despesas superam 60% do valor do veiculo, mas quando passam 24 horas de mão-de-obra!!). Hoje entregaram o carro reserva. Aguardamos a avaliação do perito sobre o futuro da caranga.

Três pessoas morreram nesta ventania toda. E vejam como quando chega a hora, não tem como escapar:
- um parado no sinal vermelho, quando uma árvore quebrou e caiu sobre seu carro;
- outro saiu por dois minutos juntar qualquer coisa no terreno quando foi atingido no pescoco/cabeca por algum objeto que estava "voando" na ventania;
- um terceiro, apesar dos avisos para todos ficarem dentro de casa, estava descendo uma montanha de carro quando o vento o tirou dos trilhos da pista, o carro escorregou no gelo e, sem controle, "blam-blam-blam" montanha abaixo.

Domingo saímos no meu Renault Diesel ano 86 véio de guerra (nesse a arvore não caiu em cima!) e vimos árvores tombadas e arrancadas com raiz e tudo, muros seculares tortos ou caídos, postes atravessados, sinaleiros virados pro lado errado etc. Percebi que não fomos tão desafortunados assim.

Até fiz uma fezinha na Euromillion que, nesta sexta, tá acumulada em 28 milhões de euros. Se eu ganhar, tá todo mundo convidado pra vir degustar as iguarias da região sudoeste, acompanhadas do vinho local... pra celebrar a vida!!! [ganhou, Zé? podemos reservar as passagens?]

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

No chão do ônibus e sem almofadas

o zé pegou um busão pro interior de são paulo, viagem de nove horas com muitas paradas. indiferente à torcida do rapazote para sentar uma mulher bonita do seu lado, o destino acabou, como sempre, colocando um velhote falante.

numa das paradas uma moça lindinha e meio riponga entrou e não tinha onde sentar. viajaria em pé ou no chão até vagar poltrona (antigamente tinha dessas coisas). o zé, muito cavalheiro, ofereceu o lugar para ela. o problema é que havia também uma velhinha em pé, e a lindinha declinou por causa da velha.

o zé, com seu espírito altruísta, cedeu o lugar para a senhora, e ficou sentadão no chão perto da moça. ela se chamava mariá. quer dizer, a mãe pôs o nome maria, mas para ser diferente ela deve ter acrescentado a mão, na certidão de nascimento, um acentozinho no "a".

conversa vai, conversa vem, beijinhos demorados, na outra parada vagou um banco. ela sentou rapidinho e, depois de alguns monossílabos trocados e nenhum beijo, "mariá" esqueceu o zé no chão, dormiu e só acordou de manhãzinha no ponto final. na despedida anotou o telefone na mão do zé. quando ele ligou, caiu num açougue.

:: 26.01.2009 ::

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Negociação para um menage

Tu já deves ter uma pessoa em mente, uma antiga namorada, ou uma amiga de confiança (da tua confiança, não da minha). Penso que se eu não conhecer bem a pessoa, é perigoso. Se eu estivesse solteira toparia no ato.

Se for uma prostituta, o que imagino não ser teu estilo, eu acho muito inseguro (embora sinta atração pelo lance "mestre-escravo"). Eu confiaria em uma amiga minha, mas ela vive em Oslo.

Se ninguém é de confiança, em último caso a gente mata a escolhida, corta em pedacinhos e joga no rio Tibagi. Claro, matamos depois que aproveitarmos bastante. Ah, eu quero guardar um pedacinho de lembrança, tá?

:: 28.03.2003 ::

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Compulsão

O importado que leva nossa heroína é silencioso, confortável, seguro. Bom demais para o motorista precário que contrataram. Ela ouve música, digere verdades e traga o gosto amargo do pó, "que merda que é cheirar e não ter com quem conversar". A garganta trava. Na casa noturna badalada, música, carne, bebidas, cheiros, mulheres, gays, homens, quase uma hora da noite e tudo pulsa. Seu corpo vibra, mas ela não está pronta para dançar. Precisa de um drink. Rostos passam na sua frente. Seios roçam com os de outra garota, lábios se mordem, "sou poderosa!"

A outra garota mexe, o umbigo se contrai, o corpo desliza de um lado para outro, mas o raio vai baixando e nossa heroína já não se sente tão bem. A garota parece não estar mais interessada. Nem a outra. Nem o voyeur do balcão do bar. O suor começa a escorrer e tudo piora. Já são mais de duas horas. Precisa de um drink. Nada nunca acontece. Olhares de descaso. Outro drink.

Tenta molhar o rosto. Os traços não parecem tão graciosos. O suor frio continua e ela não tem um tranqüilizante. Melhor é voltar para casa, tomar um comprimido e terminar com essa noite. Nada nunca dá certo.

:: 08.04.2003 ::