terça-feira, 16 de março de 2010

Chutador de macumba

Nenhum dos projetos que começo me deixam terminar. E nada de vivenciar o sucesso prometido. Toda vez que passo embaixo de um viaduto parece que vai desabar sobre mim acompanhado do caminhão pesado que sobrecarregou e fez tudo ruir. Como nas sacadas de prédios altos quando olho para baixo, em que arrepio ao pressentir minhas pernas despedaçadas no contato com o chão. Toda sacada um dia cai. E se vejo a polícia, sei que vão me parar, com ou sem motivo bloqueiam minha liberdade e se refestelam na minha presunção marginal.

O contraponto disso era quando eu andava pelas ruas e me deliciava com o próprio reflexo nas vitrines para ver como os outros me viam, meu andar, quem eu era. Esses raros momentos em que eu me reconhecia foram extirpados quando alguém que eu respeitava expressou o quanto achava aquilo ridículo. Porca hipocrisia. Agora passo pelas vitrines de olhar baixo e reprimido.

O mundo não vê o que eu vejo, você não vai entender porque naquela noite alta voltando do bar, bêbado (claro), entre urros de alegria, vi na encruzilhada uma luz fraca num amontoado de coisas. Corri feito um louco — não para o lado oposto, como era de se esperar — e chutei aquilo tudo. Ao invés de garrafa de pinga, charutos, velas, frango e farofa, meus pés revolveram brasas de piche recém aplicado no asfalto. Miopia etílica ou maldição, nunca ninguém vai saber.

Desde então toda vez que passo ao lado de uma macumba, chuto de pânico. E nada de projetos, pontes, sacadas (você sabe, tudo feito para cair), poderes públicos ou vitrines. Apenas a certeza de que umbanda, quimbanda, macumba, missa, culto, seja qual for, sei que o ritual não veio para me ajudar.

:: 14.05.2008 :: Publicado originalmente no MCP em 26.05.2008

13 comentários:

Gustavo Martins disse...

Republicação de conto antigo, daqueles preferidos, que acabam passando despercebidos pelos novos leitores.

Notem que:
1) Retrata o estado de espírito em que nos encontramos
2) Replicamos os comentários da época aqui para que não fiquem perdidos, mas deletaremos o post original

Enjoy!!!

Gustavo Martins disse...

16 comentários:

A Bruxa disse...
É de se pensar que, se dependesse de sua fé quase inabalável para tudo dar errado com você, haveria montes de engenheiros desempregados, não? ;)
26 de maio de 2008 11:54

iara disse...
minha alma sagitariana tem a fé inabalável de que tudo vai dar certo! até quando dá errado! pq se assim foi é pq este era o melhor caminho...deus, meus guias, meu anjo da guarda, sei lá, me levaram até ele...ou seja, deus escreve certo por linhas tortas!
e a soma de acertos e erros me leva a ser quem sou e estar onde estou, e eu gosto, pq tb vou chegar aonde quero.
e quem foi o doido que te disse pra não olhar pras vitrines? e quem te mandou acreditar? aposto que lá estava uma figura ímpar....umm gato! indo pelas ruas na mais santa paz...
mas macumba chuto nemmorta! mexo com energias poderosas não! rs
sagitarianas tb são supersticiosas...rs
bjs
ps: faz favor de voltar a se olhar nas vitrines
e, não, o mundo não vai cair na sua cabeça- vide asterix!
26 de maio de 2008 13:09

Flávia disse...
Esta postagem foi removida pelo autor.
26 de maio de 2008 13:10

gustavão sem tempo de logar disse...
Só para registro porque nem sempre o óbvio nos avisa que não vai dar as caras, mas o escrito "Chutador de macumba" se trata de um conto, ficção, e não de um depoimento.
26 de maio de 2008 14:27

iara disse...
é mas a minha imaginação fica assim...
foi chutar bebum o chão...pensando que era macumba e machocou o dedão!!!! saiu pulando, gritando e mancando
kkkkkkkkkkkkkkkkkk
26 de maio de 2008 14:41

A Bruxa disse...
Assim, retificando o meu comentário, troque o "com você" por "com o personagem". :)
26 de maio de 2008 14:45

Camilla disse...
É, eu morro de medo dessas macumbas perdidas...
Passo bem longe!!
Beijoo
26 de maio de 2008 14:47

Iara disse...
Mais um texto sem sexo no meio...rsrsrs
26 de maio de 2008 17:41

srta. rosa disse...
Vixe... a gente quase acredita que você tá péssimo e desacreditado, viu?
Olha, eu trouxe um vodoozinho de Buenos, pelo menos pra exorcisar uns demoninhos. Mal que não faz e esse já foi FEITO pra ser ESPETADO. Kakakaka.
Bezzos, querido!
26 de maio de 2008 19:11

Mariana disse...
Vim desejar boa noite.
26 de maio de 2008 20:08

louise disse...
Eu morro de medo de macumba, nem olho. Morando em casa de esquina/encruzilhada, imagina o que já não rolou de pratinho de farofa-fá, huahuahaua
Eu não achei que pareceu depoimento. Sério!
Bjo
27 de maio de 2008 11:23

minicontosperversos disse...
Iara: nada disso; ficou com tênis (branco de couro e novo) e canelas pretos. Engraçado foi tirar os tênis e dormir de pés brancos e canelas pretas. Patético
Bruxa: sempre o personagem; nada dessas coisas acontece com pessoas equilibradas como a gente
Camila: quer dizer que comer um franguinho e tomar uma cachacinha da macumba, nem pensar então?
Iara II: tá querendo sexo, né?
Srta. Rosa: usa o voodoo de Buenos Aires para curucar o pessoal do Boca, somos brasileiros, torcemos até pro time que eliminou nosso tricolor glorioso
Mariana: boa noite, volte sempre
Lola: conta que a gente publica aqui como contribuição
27 de maio de 2008 14:11

Mary West disse...
Oi? Naum tinha nenhum galeto com farofa naum? Muito pobre essa macumba. :D
28 de maio de 2008 14:14

Toninho Moura disse...
Antes de chutar a macumba, observe se há:
. maços de cigarros, fechados
. cachaça da boa, lacrada

Aí já livra algum.
Depois, meta o pé à vontade!
Braços!
31 de maio de 2008 21:32

minicontosperversos disse...
MaryWest - por que? as macumbas aí do norte são mais ricas?
Toninho - cara, vamos pro note que lá tem Johnny RedLabel nas macumbas; nem precisamos ir nos botecos
PS.: já imaginaram as macumbas da Bolívia?
31 de maio de 2008 23:04

FERNANDO disse...
Kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk.
Putz, miopia etílica foi foda! Dessa que ele tomou eu não quero nem a tampa, porque já fiquei bêbado só de ler o conto.
3 de julho de 2008 19:19

Gustavo Martins disse...

Saudade desse povo que comentava um monte nos blogs e hoje vive mais na tuitosfera...

Tem gente aí que até já faleceu... Não sem antes deletar todos os seus coment´parios do MCP!

Bons tempos!

Carol disse...

Esse, pra mim, é um dos Top 5. Li na 'viagem' que fiz pelo MCP. [impressionante, como é bom 'viajar' aqui, em todos os sentidos]

A culpa é do dedinho podre, acredito eu. (mas nem sou dessa ou daquela época, então, mais uma 'viagem')
Eu, como mera espectadora, queria ver o que você vê. Maldições; etílicas [ou não]. Mas só ver; o resto, eu deixo só pra você mesmo.

E o saudosismo... hum... quase bonitinho.

Vampira Dea disse...

Vixe fiquei até com medo! E olha que eu já fui macumbeira. Não sei que lei se aplica nesse caso, a de Murphy ou a do dedo podre como disse a Carol. Acho que na verdade tá precisando em vez de chutar fazer uma macumbinha básica, mas como isso é caro na falta de alternativa chuta mesmo pra ver se carrega o macumbeiro pro buraco junto com vc.
Quanto aos comentários eu estou fazendo uma campanha com os twiteiros de plantão. Twitter é legal mas não satisfaz, tem gosto de coisa pela metade, o pior é que o pessoal além de não visitar e comentar não estão escrevendo, tem blog massa por aí cheio de pucumã de aranha. Vamos escrever mais de 140 pessoal.

Maria disse...

gente que só quer saber de tuitosfera e mal comenta em blogs: você, por exemplo.

caramba, aqui tem comentário até da senhorita rosa... você sabe que temos uma história "out net", né? ela disse que ia abandonar o blog, mas pelo que acabei de ir conferir, parece que voltou.

autor disse...

são esses os que eu mais gosto de você
mas vc já sabe disso também
beijo

Índia Jurema Preta, Bicho véio, Filosofo Fabriciano disse...

Chuta que é macumba! hehehe Axé!

Vitão

Índia Jurema Preta, Bicho véio, Filosofo Fabriciano disse...

Pula que é ebó!

Gustavo Martins disse...

carol - lembra, linda... histórias vividas e histórias contadas; na parte do inferno astral, vivida... isso de chutar macumba, fica para uma análise mais apurada

vampiradea - 100% a favor da campanha #VamosEscreverMaisDe140

e sobre dedo podre (preferimos Badfinger), o nosso até que cura

maria - nem tanto tá? isso de só ntuitosfera

o conto que vai ao ar hoje explica um pouco CERTOS afastamentos da blogosfera (dica criptográfica: saravá intenso

cassiana - esses são os que vêm das entranhas

vitão - putaqueopariu! virou macumbeiro de uma vez! também, com as influências de vários lados

a propósito, encomenda um "desencosto" pra gente; os anjos nda guarda andam MUITO cansados

Ce disse...

Gustavo, este é um dos meus contos prediletos.
As pessoas devem respeitar a opinião e o jeito dos outros.
No entanto, temos que nos lembrar que nem todo mundo que concorda com a gente, é quem realmente gosta da gente.
Nós, que somos pais, por exemplo, sabemos quantas vezes temos que dizer um “não” pros filhos, com o coração apertado.
Principalmente quem é irreverente, tem que ser humilde e reconhecer que tem defeitos, e sábio para discernir quando uma crítica é construtiva ou não.
Se sairmos chutando a macumba toda vez que ouvirmos o que não queremos, podemos acabar perdendo pessoas que gostam da gente de verdade.

R. Paschoal disse...

Diz um amigo, que macumba só pega em quem acredita.

Concordo com ele, mas de qualquer forma eu evito chutar... rs rs

Gustavo Martins disse...

ce - no caso em particular, não tem a ver com ouvir nãos ou discordâncias, mas com o MUNDO TIODO batendo de frente

inferno astral, descontrole // pode ser que passe

r. paschoal - concordamos 100% com você e o amigo