As vezes em que me sinto mulher de forma mais notável nada têm a ver com um corpo masculino biblicamente unido ao meu. São repentes revestidos de razões insidiosas que surgem se impondo sobre as previsibilidades todas, e cuja principal prerrogativa é a maestria em transcender o banal — e, nessas horas, me sinto completa e desmedidamente mulher. Fêmea.
Nesses instantes não temo essa misteriosa condição feminina, e chego a quase compreendê-la — e, ainda que não a desvende claramente, emudeço os questionamentos e a ela me entrego, transfigurada em docilidade febril, e sinto seus assomos a me fervilharem o sangue enquanto meus olhos, fixos no espelho, acompanham a camisola de seda percorrendo meu corpo rumo ao chão em uma carícia trêmula de mãos de amante, ou quando me surpreendo a dilacerar os descabimentos e incompreensões com toda a indisciplina dos meus instintos e minhas unhas vermelho-escuras. E a sinto no simples arfar do peito, no eriçar dos pêlos, nas minhas gotas que me encharcam a roupa e deixam rastros cálidos de insensatez sob meus pés nus durante esses arroubos deliciosamente imprevisíveis.
Nesses instantes — em que me desligo, destituída de culpas ou consciências, de quaisquer premeditações e moralismos para apenas gozar a languidez dos mistérios deste sexo tão singular na intimidade do meu espírito — ignoro tudo que não seja essa feminilidade visceral e selvagem, e me deixo possuir, anônima, inteira, pelo seu despudor sacrossanto e incoercível, pela sua fúria mansa de ingenuidade diabolicamente despretensiosa. E não raciocino, e não me renego, e não me retenho: apenas sinto, ilimitada e veemente, a explosão devastadora desse estado inexplicável, causa e efeito da minha alma de mulher.
13 comentários:
Amanhã, mais uma contribuição, perversa e curtinha.
Sacramento!!!
[...] ou quando me surpreendo a dilacerar os descabimentos e incompreensões com toda a indisciplina dos meus instintos e minhas unhas vermelho-escuras. E a sinto no simples arfar do peito, no eriçar dos pêlos, nas minhas gotas que me encharcam a roupa e deixam rastros cálidos de insensatez sob meus pés nus [...]
(sem fôlego para continuar)
muito bem escrito! uau
adorei o detalhe das unhas vermelhas...
aguardo ansiosamente o próximo.
bjs
Lindo!!!
Ser mulher, afinal de contas, é muito mais do que ter um pedaço de homem em nós (literalmente ou não...).
Hey! Obrigada pelo comentário no blog. =)
Abraço.
Pois então...Na verdade "aquele", que vc alcunhou de docinho, já não é mais...Parei há um tempo de postar por lá...
Quanto à Capricho...Sem comentários...=)
Abraço.
A contribuição que era pra hoje fica pra amanhã, ok? DIas muito cheios.
JEAN - "sacramento"? pareceu aquelas expressões de dublagem de filmes/seriados antigos. lembra? não sei se eram pudicos (pra traduzir literalmente) ou preguiçosos (para versar, o que é mais recomendável) expressões como "holy shit" ou "damn hell". macacos me mordam!
agora, que esse "minhas gotas que me encharcam a roupa" é de derrubar o cristão da cadeira, isso é mesmo.
Oi, tudo bem?
Então, agora estou aqui.
Será que você sabe quem sou?
Bjo
Ainda é cedo, então perdão.
O texto da Flávia, é maravilhoso.
Adoro.
Tirou o ar.
Vê-lo por aqui foi bacana.
Bjo
hehehe...
Ainda bem que eu não escrevi "Caçarola!" ou "Carácoles".
E, também, não sou muito de palavrão, porra!
Bão, Gustavão, na verdade eu voltei aqui pra te convidar para prestigiar a inauguração do meu novo blog, "FocoLibre - Todas as Paixões". Se quiser dar uma passada, etou lá em
http://www.focolibre.co.cc
Abraço e desde já agradeço!!!
(p.s.: você está linkado lá, desde o início)
Oi? Quando crescer quero escrever assim. Muito bom mesmo.
Eu já havia dito à Flavinha no blogue dela que este texto era estupendo, uma bomba. E continua sendo.
Abraços!
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